poderia viver banhando seu corpo prazerosamente nas águas mansas do doce rio Guajarina, no Pará, numa das bacias que vertem do encontro amoroso, beijo da terra e o céu, Pachakamac, aos cumes nevados da Pachamama, a Cordilheira dos Andes, que se derretem, irrigam de vida o continente sul Americano. Ou talvez, viver calmamente contemplando as revoadas graciosas dos pássaros sobre esse rio. Mas quis a sorte que ela rompesse uma imensa fila de outras cerca de quinhentas candidatas. Por conta e risco ainda adolescente, sorveu o ar da floresta e se encheu de coragem para esse inédito concurso em sua vida, em 1985. Um raio de luz dourado iluminou a corajosa menina. Foi selecionada para atuar no longa americano “A Floresta de Esmeraldas”, interpretando Kachiri, do diretor inglês John Boorman. O impacto das barragens sobre os povos originário e ribeirinhos da Amazônia, tema do filme, certamente foi tatuado em seu corpo e sua vida. Nascia uma estrela para o cinema brasileiro, para o povo feliz e sofrido onde a terra, a agua e os céu se fundem no seio na floresta Amazônica. Tal qual a garça azul que se arremessa da água para o céu, a menina se fez mundo, e foram dezenas de filmes, teatro e novelas. Hoje se abriga numa casa-arvore, em volta de um pântano, na Lagoa da Barra, no Rio do Janeiro. Cidade onde se apurou seu pensamento decolonial e se tornou filósofa pela Universidade Federal desse Estado. Ali reside a menina paraense/índia que emergiu das veredas, dos muritis, palmeira resistente da família das arecáceas, o buriti como é conhecido em Mato Grosso e em outras regiões. Lá, ao nascer leonina ficou eternamente regida pelo brilho do sol. Sua terra, Abaetetuba, também ressoa na palavra de origem tupi guarani. Sinônimo de um lugar de abundância, onde brota gente forte e valente tal qual a menina Dira que foi batizada por inúmeras ilhas, navegando nas rebetas, canoas e barcos. Hoje a sua cidade natal é a capital do Muriti, celeiro da criação artesanal. Repercutindo pelas mãos de seus artesãos a simbologia da infância, dos brinquedos, da fantasia. Pássaros e signos esculpidos na madeira. Daqui de Mato Grosso por ser fronteira com seu Estado natal, ainda podemos imaginar e degustar os licores, os bombons e os frutos da Amazônia.
Na terra de Dira os muritis são esculpidos como entes encantados pelas mãos dos artesãos, na madeira macia do Buriti. Canecas, barcos, cobras, bichos, araras, barquinhos. Da palha se tiram a cobertura das casas, as redes, as cestarias e os famosos muritis. Produtos reconhecidos e tombados pelo Iphan como Patrimônio Histórico Artístico Cultural do Brasil.
Os brinquedos de muriti também são pássaros gerados pela imaginação de seu povo, que voaram para o mundo inteiro. Assim como os pássaros de Miriti, Dira Paes via a sua arte voar, encantando e conquistando outros povos.
Magnitude de uma vida premiada pelos mais cobiçados prêmios do Cinema Brasileiro. Em Cuiabá, em 1997, no Festival de Cinema dessa cidade, a já moça ganhou o primeiro prêmio de sua carreira como melhor atriz. A saga amorosa de Dada, companheira de Corisco foi contada pela maestria de Rosemberg Cariry. Uma enxurrada de prêmio começou desde então.
Em 2023 Dira Paes foi eleita melhor atriz pelo Grande Prêmio do Cinema Brasileiro, por interpretar Pureza, personagem principal do filme inspirado na história de vida de Pureza Lopes Loyola. O filme narra a busca incansável de uma mãe por seu filho Abel até encontrá-lo explorado no trabalho análogo à escravidão, mera coincidência com a situação análogo de centenas de trabalhadores em Mato Grosso. Ao receber o prêmio Dira afirmou: