homenageado
Silvino Santos, o cineasta da selva
A 22ª edição do festival terá como homenageado o cineasta Silvino Santos (1886-1970) – o cineasta da selva nascido em Portugal em 1886, Silvino Santos chegou ao Brasil ainda jovem e tornou-se um dos mais importantes documentaristas da Amazônia no século XX. Autodidata, começou como fotógrafo nos seringais antes de se aventurar pelo cinema, desenvolvendo uma abordagem única que mesclava registro etnográfico com sensibilidade poética. Sua filmografia retrata com raro humanismo a vida dos seringueiros, indígenas e imigrantes que desbravaram a região, oferecendo um olhar pioneiro sobre a relação entre homem e natureza na floresta tropical.
Entre suas obras, destaca-se o documentário “Amazonas, o Maior Rio do Mundo” (1931), encomendado pelo governo do Amazonas para a Exposição Internacional de Sevilha. Este marco do cinema brasileiro capturou a grandiosidade do rio Amazonas através de técnicas inovadoras para a época, incluindo tomadas aéreas pioneiras que revelavam a imensidão da paisagem. O filme documenta não apenas a geografia majestosa, mas principalmente o cotidiano das populações ribeirinhas, os ciclos econômicos da borracha e da castanha, e as tradições culturais caboclas que permaneciam à margem dos registros oficiais.
Considerado o primeiro longa-metragem genuinamente amazônico, “Amazonas, o Maior Rio do Mundo” transcende seu caráter inicial de peça promocional para se tornar um documento histórico fundamental. Suas imagens preservam memórias de uma Amazônia pré-moderna, registrando tanto a exuberância natural quanto as duras condições de trabalho nas comunidades extrativistas. A obra hoje é reconhecida pela Cinemateca Brasileira como patrimônio audiovisual nacional, testemunhando a visão pioneira de Silvino Santos, que soube como poucos transformar a câmera em instrumento de revelação social e ambiental.
O legado de Silvino Santos ganha especial relevância contemporânea ao antecipar debates atuais sobre representação indígena no cinema, justiça socioambiental e o papel do audiovisual na preservação da memória cultural. Seu trabalho transcende o registro documental para se afirmar como arte engajada, oferecendo não apenas imagens da selva, mas principalmente dando voz e rosto aos que nela viviam e lutavam – um testemunho permanente da resistência humana na maior floresta tropical do planeta.
“Amazonas, o Maior Rio do Mundo”
O filme desapareceu misteriosamente após sua exibição na Europa. Durante décadas, acreditou-se que as únicas cópias haviam sido perdidas ou destruídas, até que, nos anos 1980, uma cópia foi milagrosamente encontrada nos arquivos de uma cinemateca europeia – havia sido “emprestada” sem autorização e simplesmente esquecida. O filme que Silvino Santos levara pessoalmente para a Europa acabou ficando desaparecido por quase 50 anos, tornando-se uma lenda do cinema brasileiro.
Quando finalmente recuperado e restaurado, “Amazonas, o Maior Rio do Mundo” revelou-se um documento ainda mais valioso do que se imaginava. Suas imagens pioneiras – incluindo tomadas aéreas revolucionárias para a época – não apenas mostravam a grandiosidade do rio, mas capturavam o cotidiano das populações ribeirinhas com uma profundidade humana rara. O filme retratava os ciclos econômicos da borracha e da castanha, as tradições culturais caboclas e a relação íntima entre o homem e a floresta, tudo com uma qualidade técnica surpreendente para os recursos da época.
A redescoberta do filme nos anos 1980 permitiu reavaliar o lugar de Silvino Santos na história do cinema. Mais do que um simples documentarista, ele revelou-se um artista com olhar antropológico aguçado, capaz de mostrar tanto a majestade da natureza quanto a dignidade dos trabalhadores seringueiros. Hoje preservado pela Cinemateca Brasileira como patrimônio nacional, “Amazonas, o Maior Rio do Mundo” permanece como testemunho de uma Amazônia que já não existe – e como lembrete do valor da preservação de nossa memória audiovisual.
A história do filme perdido e reencontrado espelha, de certa forma, a própria trajetória de seu criador: como Silvino Santos, que chegou como imigrante e se tornou o mais amazônico dos cineastas, sua obra atravessou fronteiras, desapareceu e finalmente retornou para reafirmar seu lugar fundamental na cultura brasileira. O resgate desse tesouro cinematográfico nos lembra que, na era do streaming e da produção acelerada, algumas imagens continuam a carregar o poder de nos mostrar quem fomos – e quem ainda podemos ser